Paul McCartney realiza mais dois da turnê “Got Back”, em São Paulo, apenas dez meses após sua última passagem pelo Brasil. As apresentações resultaram em mais duas noites antológicas para a história do beatle no país.
PAUL McCARTNEY – BRASIL 2024
Allianz Parque – São Paulo/SP
15 e 16 de outubro de 2024
TEXTO: Robert Moura
FOTOS: Marcos Hermes
Paul McCartney deve ter decepcionado muita gente nessa sua nova vinda ao Brasil. Sim, vocês não leram errado. Ele certamente deixou um contingente de pessoas frustradas sem ter o que dizer. Refiro-me àqueles que, ano passado, anunciavam a aposentadoria do músico, devido à sua idade. Que essas bocas malditas se calem porque McCartney, do auge de seus 82 anos, na noite de 15 de outubro de 2024, fez um de seus melhores shows e performances vocais dos últimos tempos. Sabe-se lá, se algo das críticas brazucas chegou ao Macca, mas o que ele cantou em “Maybe I’m Amazed”, por exemplo, foi um absurdo.
De volta, apenas dez meses depois de sua última vinda aqui com a mesma “Got Back Tour” com a qual realizou nove shows (a Rock Press cobriu seis dessas apresentações, confira nos links no final da matéria), Paul fez poucas alterações no setlist para as apresentações ocorridas no Allianz Parque, em São Paulo, nos dias 15 e de 16 de outubro (a turnê também contou com um show em Florianópolis, no dia 19/10). A mais marcante, sem dúvidas, foi a inclusão de “Now and Then” que veio ao mundo no ano passado como a última canção dos Beatles. A gravação era um resquício do projeto Anthology, lançado em meados dos anos 1990, que incluiu “Free as Bird” e “Real Love”, duas canções inéditas da lavra de John Lennon que contaram com o trabalho de Paul, George Harrison e Ringo Starr para sua finalização. Uma terceira gravação foi abandonada na ocasião, por julgarem os resultados insatisfatórios, entre eles a qualidade do áudio original de Lennon. Com os avanços tecnológicos, foi possível aumentar a qualidade do som, e os resultados não foram diferentes do esperado, levando a canção ao topo das paradas. Sua inclusão no repertório da turnê foi uma grata surpresa e a interpretação ao vivo com as imagens do clipe exibidas no telão torna a apresentação ainda mais tocante. Aliás, esse, como outros vídeos passaram por algumas alterações e adições de imagens, o que também foi uma novidade muito bem-vinda.
O setlist integral contou com 37 canções, apresentadas durante duas horas e trinta e cinco minutos de espetáculo. Paul abriu com “A Hard Day’s Night” (alterando para “Can’t Buy Me Love”, na segunda noite), e deu sequência com “Junior’s Farm”, “Letting Go”, “Drive My Car” (no segundo show, foi substituída por “All My Loving” que não havia sido tocada ainda nessa turnê), “Got To Get To Into My Life”, “Come On To Me”, “Let Me Roll It” (com aquele trechinho de “Foxy Lady” que ele toca para homenagear Jimi Hendrix a quem declarou seu amor e chamou de “grande, belo e adorável cara”), “Getting Better”, “Let ‘Em In”, “My Valentine”, “Nineteen Hundred Eighty-Five”, “Maybe I’m Amazed”, “I’ve Just Seen a Face”, “In Spite Of All Danger” (na segunda noite, após um erro na entrada de seu solo de violão, Paul interrompeu a música, reiniciando do mesmo ponto com o despojamento habitual de outras vezes em que esse tipo de situação ocorreu em algum de seus shows), “Love Me Do”, “Dance Tonight”, “Blackbird”, “Here Today” (dedicada ao “mano” John), “Now and Then”, “New”, “Lady Madonna”, “Jet”, “Being For The Benefit Of Mr. Kite!”, “Something” (em tributo ao seu “parça”, George Harrison), “Ob-La-Di, Ob-La-Da”, “Band On The Run”, “Get Back”, “Let It Be”, “Live And Let Die” e “Hey Jude”. Ficaram para o bis “I’ve Got A Feeling” (em dueto virtual com o John Lennon), “Birthday” (trocada por “Day Tripper”, na segunda apresentação), “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (Reprise)”, “Helter Skelter” e o medley “Golden Slumbers/Carry The Weight/In The End”.
Falando em repertório, é bom lembrar-nos do DJ Chris Holmes, responsável pelo esquenta do show. Holmes iniciou sua participação na terça-feira com remix de “Para Lennon e McCartney” (canção de Fernando Brant, Márcio e Lô Borges) na voz de Milton Nascimento que, assim como ano passado quando assistiu a alguns shows da “Got Back Tour”, também voltou a conferir o beatle ao vivo, marcando presença no Allianz Parque. Um remix da gravação de “The Fool On The Hill”, de Sérgio Mendes também foi tocada, assim como a versão de Rita Lee para “In My Life” e dezenas de outras canções dos Beatles e de Paul, em remixes a partir de suas versões originais ou regravações de outros artistas como “We Can Work It Out”, por Stevie Wonder.
A banda segue firme com Abe Laboriel Jr. (bateria, percussão e backing vocals), Rusty Anderson (guitarra, violão e backing vocals), Brian Ray (baixo, guitarra, violão e backing vocals) e Paul “Wix” Wickens (teclados, acordeom, gaita, violão, percussão e direção musical), acrescida do naipe de metais Hot City Horns formado por Mike Davis (trompete), Kenji Fenton (saxofone) e Paul Burton (trombone), além do dono do negócio nos vocais, baixo, guitarra, violão, piano, bandolim e ukulele.
No mais, Macca brincou de falar português como sempre, e curiosamente quando pronunciou “canción” em espanhol (vale lembrar que ele vinha de shows no Chile, Argentina e Uruguai), corrigiu rapidamente para “canção” com um inesperado som nasal, incomum para um inglês. E nem mesmo um pigarro no meio da segunda noite fez o artista perder o pique.
Um questionamento que apareceu com certa frequência nas conversas foi o porquê assistir ao “mesmo” show novamente. As aspas que coloco na palavra “mesmo”, já dizem o que penso. Ainda que a banda toque exatamente as mesmas músicas na mesma ordem, que o cantor dê boa noite com a mesma entonação, e faça os mesmos comentários antes de apresentar cada música, um show ao vivo NUNCA é igual. É como uma peça de teatro. Não importa quantas vezes você a veja, ela nunca será igual. Afinal, não é porque você conhece o texto que não vai se emocionar com uma grande atuação. É idêntico com a música. E assim é um show de Paul McCartney. Sabe aquela lasanha que sua mãe faz desde a sua infância e que a cada vez que ela prepara você já sabe o que esperar do cheiro, do tempero, da textura? E apesar disso, na primeira garfada o sabor lhe surpreende por mais que você o reconheça. A mistura de sensações que essa culinária produz, para além do paladar, aroma, tato, visão, tocando memória afetiva e saciedade, não está distante da experiência do show. Tal qual a lasanha da mamãe, o show, embora feito com um mesmo padrão, ingredientes e temperos é reconhecível, mas nunca é igual para quem tem sensibilidade e consegue degustá-los ao invés de apenas engoli-los quase sem mastigar. No mais, não vejo a hora de saborear novamente essa lasanha e ver outro show do Paul! – Robert Moura.
Relembre – “Got Back Tour” – Brasil 2023:
BRASÍLIA: https://portalrockpress.com.br/paul-mccartney-brasilia-2023/
BELO HORIZONTE: https://portalrockpress.com.br/paul-mccartney-belo-horizonte-mg-2023/
SÃO PAULO: https://portalrockpress.com.br/paul-mccartney-sao-paulo-2023/
RIO DE JANEIRO: https://portalrockpress.com.br/paul-mccartney-rio-de-janeiro-2023/
ROBERT MOURA – É natural de Belo Horizonte. Doutorando em Música (UFRJ), mestre em Artes (UEMG) e bacharel em Música (UEMG). Fundador e professor da Alaúde Escola de Música. Tocou guitarra em bandas de rock na capital mineira. Atualmente, seu trabalho está focado no violão clássico e composição. Em 2021, lançou o EP digital “Ensaio Para A Morte” com a trilha sonora que compôs para a peça homônima, e em 2023 lançou os singles “A Rosa de Heitor” e “Júpiter e Marte”, compostas para a trilha da peça “Heitor”. Em 2024, com a cobertura desses dois shows para o Portal Rock Press, completou 17 shows do Velho Macca no currículo.