C6 FEST 2024: Crônicas Críticas & Críticas Crônicas! – PARTE 1

A edição 2024 do C6 Fest aconteceu em São Paulo nos dias 17, 18 e 19 de maio, a Rock Press esteve presente no Parque do Ibirapuera conferindo algumas apresentações, entre elas, RAYE, Black Pumas e do Fausto Fawcett, que se apresentaram no sábado (18). Saiba mais na matéria que segue…

C6 FEST 2024:
Crônicas Críticas & Críticas Crônicas! – Parte 1

Parque do Ibirapuera – São Paulo/SP
Sábado – 18 de Maio de 2024
TEXTO e FOTOS: Gabriel Farina

O C6 Fest, que já tinha tido sua sexta-feira íntima e de lotação esgotada de jazz para uma plateia sentada e controlada, elevou-se ao sol de um sábado no Parque do Ibirapuera. Tudo acontecia enquanto a segunda edição do evento mostrava se iria mesmo se perpetuar no cenário cada vez maior de festivais internacionais no Brasil. Parece que sim. Há algo na identidade visual do preto e branco do banco que representa o lugar que ele ocupa: vanguardista nos atos pop e conservador nos atos alternativos. Preto e branco.

A curadoria em si amplia a visão do Festival Popload e parece se limitar a ser um Primavera Sound com menores headliners. Hermano Viana, chefe da curadoria do C6 Fest, reforçou o que já estava exposto na publicidade do evento: fazer um diálogo entre o novo e o clássico. De fato, o maior mérito da programação foi trazer músicos ao Brasil pela primeira vez. Nomes que tocaram no festival acumulam milhares de ouvintes mensais no Spotify e mesmo assim são novatos por aqui. O algoritmo é posto em cheque nos maiores ares tropicais que sopram nesse mundo.

RAYE

Não dá para saber o que veio primeiro quando vi RAYE no Palco Heineken do C6. Talvez tenha sido sua presença adornada em vestido vermelho, ambos seus braços sempre em expressão enquanto ela segurava o microfone. Talvez tenha sido sua voz, que cantava e falava em um sotaque britânico como se estivesse cantando em um clube de jazz mesmo que na frente de milhares de pessoas. Amy Winehouse, claro, me veio à mente. Interessante notar, que como apesar do indiscutível e já lendário espaço que Amy tenha na cultura popular, a própria RAYE tem mais popularidade nos streamings que ela. RAYE hoje tem 32,4 milhões de ouvintes mensais – quase 10 milhões a mais que os 22,7 milhões de Amy Winehouse. O que isso quer dizer? Bem, não muita coisa em termo de comparação com certeza. Mas esse diálogo entre os números e o real nunca foi tão interessante quanto atualmente.

RAYE soube conversar com seu público. Até literalmente mesmo. Apesar de sempre em inglês, ela contava histórias antes de suas interpretações – algo que coloca um holofote em seu lado compositora mesmo no palco. Sua figura majestosa e atemporal de cantora de jazz sagrada na música ocidental ascendia para falar coisas mundanas, coisas a ver com esse século, com o presente. Logo, no início RAYE reclamou de ter comido ostras e estar tendo dor de barriga desde então. Falou isso sem deixar, em nenhum momento, de parecer classy.

Bem, eu falo de jazz, mas você sabe, os gêneros musicais como conhecemos estão acabando. Estão se mesclando e se fundindo e se recaracterizando. RAYE, é sobretudo, uma cantora pop. Sua banda, também trajada elegantemente, sabia esse ponto certo e exato. Destaco aqui a figura da baixista Olivia Thompson sempre atrás de um sintetizador com um terno azul bebê.

Uma imagem que causou grande impacto na área aberta do Palco Heineken foi RAYE cantando sua (música) Mary Jane para esse país onde nossa Maria Joana não é legalizada em nenhum estado. Que mundo vivemos! Quer dizer, o Planet Hemp tem feito isso há décadas por aqui e a situação continua a mesma – ou pelo menos bem semelhante. Mesmo assim, foi ótimo ver a música apresentada na forma feminina de uma jazz pop-singer para um público não tão previsível como foi por aqui.

BLACK PUMAS

Tentei correr entre um palco e outro – como usualmente as pessoas fazem em festivais – com o objetivo de ver os veteranos pop-oitentistas do Soft Cell que estavam na Tenda MetLife. Bem, o Parque do Ibirapuera é um lugar grande e os dois palcos são terrivelmente afastados um do outro, o que causa tumulto e uma dificuldade maior de locomoção – além da própria distância – por isso. Voltei para o palco Heineken. Não queria perder o Black Pumas, cujo horário conflitava com o do Soft Cell. A vida é feita de escolhas como dizem.

O outono começou a finalmente chegar em São Paulo. No espaço aberto enfeitado pelas estrelas rubras da marca de cerveja, o frio chegava aos poucos naquela noite dentro de um ano em que o aquecimento global parece cada vez mais negar as estações neste país. Bem, enquanto à cerveja, o destaque foi a presença da Blue Moon, cerveja cítrica estadunidense que teve uma presença maior de importação no Brasil recentemente e agora começou a ser distribuída pela Coca-Cola, que também distribui a Heineken. Sou fã dela. Enquanto à música, o Black Pumas parecia desabrochar na noite como primavera. Virei grande fã deles também.

Eric Burton é o nome do vocalista do Black Pumas – não confundir com Eric Burdon, dos Animals. Embora existam semelhanças entre os dois Erics – principalmente no que tange a gigante voz virtuosa soulzística de ambos – como frontman, o Eric do Black Pumas tem muito mais a ver com um Mick Jagger: frenético como se a primeira música fosse a última e a última fosse a primeira. No segundo número do setlist, Burton já foi de encontro à plateia. Subiu na grade e explodiu nos braços dos fãs apaixonados, que sem mais nenhuma banda esperando na programação do palco, estavam lá só para eles.

Eric tinha uma jaqueta floral com a qual permaneceu, mesmo suando, ao redor de toda a apresentação. “Colors” é o maior hit da banda. Em números, o single tem quase 210 milhões de streamings no Spotify. Nessa música, até quem estava vendo de longe se aproximou do palco. Talvez para viver a experiência da canção sendo tocada ao vivo, talvez pensando nos Stories do Instagram. De qualquer forma, o Black Pumas, que é um duo no qual o guitarrista e produtor Adrian Quesada é a outra metade, mostrou sua importância no cenário atual de um jeito que até quem não sabia de nada sobre a banda tenha entendido.

Aquele tipo de energia, que só poderia ser emanada através da música e de frontmans James Browneanos que ressoam ela, eletrocutou o público do festival em disparo naquela noite de sábado. De modo que ninguém ali parecia querer ir para casa. O êxodo de gente tinha uma direção: o palco Pacubra, onde iria se apresentar o carioca Fausto Fawcett.

FAUSTO FAWCETT

Aquele tipo de energia, que só poderia ser emanada através da música e de frontmans James Browneanos que ressoam ela, eletrocutou o público do festival em disparo naquela noite de sábado. De modo que ninguém ali parecia querer ir para casa. O êxodo de gente tinha uma direção: o palco Pacubra, o único dos três onde ainda iria acontecer música. Por lá se apresentaria o carioca Fausto Fawcett.

Acho difícil pensar em um cenário no Século XXI onde uma multidão de pessoas se direciona para ver o vanguardista pop e carioquíssimo Fausto Fawcett. Isso em São Paulo, tenha em mente. Essa relação como música gravada só poderia ter se concretizado nos ares dos anos 80 no Brasil. A censura direta tinha acabado e a indústria cultural nacional ainda não sabia direcionar as massas. Época de Rock ‘n’ Roll. Época de Kátia Flávia, a Godiva do Irajá. Época de Fausto Fawcett.

Quem visse aquela quantidade de gente ansiando um show de Fawcett duvidaria que sua época tivesse acabado. Antes de me direcionar ao palco, ouvi gente falando que não dava para entrar – que por lá estava “o caos”, etc e tal. Que grande oportunidade! Prestigiar “o caos” sob o som de Fausto Fawcett em pleno ano de dois mil e vinte e quatro.

O festival estava cheio de funcionários encarregados de orientar o público para onde ele quisesse ir. Não é para menos. Quando perguntei como chegar ao Palco Pacubra, um deles me disse para seguir uma trilha. Ênfase na palavra “trilha”, que sempre parece sugerir perrengue. Então ele me orientou que perguntasse a outros dos funcionários encarregados de orientar o público para que tivesse uma melhor orientação.

Pois bem, no meio de muito andar (muito mais do que gostaria em um final de festival), comecei a ver hordas de gente na direção contrária. Muitos reclamando e tudo mais. Perguntei a mais um dos vários funcionários dispostos ao redor do parque se a direção em que eu seguia era mesmo a correta para se chegar ao Palco Pacubra. Ele disse que era – mas que o lugar estava com superlotação e estavam mandando o pessoal ir embora. Então, eu lhe disse que era da imprensa e coisa e tal – e ele me falou para perguntar mais a frente para outro funcionário.

Cheguei ao portão onde estavam barrando o próprio público do festival – com suas pulseiras e ingressos – de ver uma das atrações do evento. Um jovem adulto parecia mais revoltado com a situação do que os outros que foram embora. Ele estava discutindo com um funcionário, dessa vez com a camisa da logo do banco, impostando sua voz e dizendo que queria um reembolso do valor do ingresso. Logo atrás, uma mulher adulta estava em claro desespero com a impossibilidade de ver o Fausto Fawcett. Disse que tinha viajado só para isso. O funcionário de preto e branco C6 Bank se compadeceu. Disse que veria com mais gente e essas coisas.

Quando eu lhe disse que era da imprensa, ele, que ainda se mantinha educado, me disse para entrar pela saída. Bem, pela saída tinha outro funcionário que me impediu de entrar. Então, no momento em que decidi insistir, chegou uma ordem de algum lugar para deixar todo mundo entrar. Todo mundo entrou.

O Pacubra é um lugar fechado. Quando entrei, percebi que tudo parecia uma dimensão utópica cyberpunk paulista-carioca. Um mundo onde uma balada cheia de jovens de classe média gerações X e Z dançam para a poesia marginal eletrônica de Fausto Fawcett como fariam em um set de um DJ local. Enfatizo a presença do Rio de Janeiro naquele lugar e naquela noite extremamente paulistanos, pois, Fausto carrega o Rio como personagem translúcido e etéreo em suas canções. É a Godiva do Irajá que se escondeu em Copa. É o Rio a cidade maravilha da beleza e do caos.

Apesar da minha pulseira de imprensa, não consegui, assim como meu colega, chegar perto do palco. Então, subi em uma rampa e tirei algumas fotos. De lá observei o espetáculo de Fawcett com pilastras digitais que transmitiam as artes construídas para o show. Gostei bastante delas. O ambiente parecia uma ilustração medieval com tudo acontecendo ao mesmo tempo. De certa forma combinou. BNegão, membro do Planet Hemp, subiu ao palco em determinado momento. Poesia livre e pulsante na frente de um computador com beats. Fausto é um dos grandes artistas deste país. Caótico, belo e carioca.

E teve mais…
O evento continuou no domingo, com shows da Cat Power, Noah Cyrus, Pavement entre outras apresentações e marcamos presença. Leia AQUI! – Gabriel Farina.

GABRIEL FARINA – Escreve por necessidade embora ainda não ganhe a vida com isso. Ouve Rock ‘n’ Roll desde que existe e música continua sendo a principal razão pela qual ele respira. Está cursando Jornalismo pela UFRRJ e é apaixonado justamente pela faceta musical do fazer. Realiza empreitadas pelo mundo das artes para além da escrita jornalística: faz música, pinta, se arrisca atrás de lentes e escreve em versos poéticos sem publicação. Alguns de seus textos estão disponíveis através de links na internet embora ele goste mesmo de coisa analógica. Para ele, discos de vinil são a amostra do mundo material mais valiosa. Nascido em Resende/RJ e morando na Baixada Fluminense, ele tem coisas a dizer sobre esse estado. Não come carne (nem mesmo peixe) já tem um tempo e é muito orgulhoso disso. Torce para o Flamengo por causa, primeiramente, de seu pai – e segundamente por ser, de fato, o maior time do Brasil. Tem tatuagem do Bob Dylan, Leonard Cohen, Gram Parsons, Lou Reed e São Jorge. Dirige o ainda não lançado mini-doc “Canto Geral – Uma Livraria em Seropédica”.

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