O novo filme do cineasta e comediante Jordan Peele estreou nos cinemas nacionais no último, dia 25 de agosto. “Não! Não Olhe!” traz grande expectativa após o sucesso de seus longas anteriores.
TEXTO: Nilvio Pessanha
IMAGENS: Divulgação
Antes de ingressar no terreno do horror, Jordan Peele era conhecido como um comediante com trabalhos em programas de esquetes de humor, incluindo a versão televisiva da lendária Revista MAD – o MAD TV – e a série Key & Peele. O diretor nova-iorquino surpreendeu a todos com o terror de temática racial “Corra”, em 2017. Seu primeiro longa foi um sucesso de público e crítica e rendeu ao cineasta o Oscar de melhor roteiro original. Veio então seu segundo filme, “Nós”, em 2019. Um novo horror com temática social e mais um novo sucesso para a carreira do diretor.
O êxito dos filmes anteriores justifica toda a expectativa em torno de seu novo longa-metragem, “Não! Não Olhe!”. E essa expectativa não é frustrada. Peele retorna com um terror novamente dentro da seara de reflexão social e dessa vez lançando mão de metalinguagem para construir uma história que fala, dentre outros elementos, de reparação histórica.
A trama parte do casal de irmãos OJ e Emerald, vividos por Daniel Kaluya – novamente protagonista de Jordan Peele, numa atuação segura – e Keke Palmer – numa interpretação excelente. Os irmãos Haywood buscam superar afetiva e financeiramente a perda do pai, que administrava o rancho onde vivem e treinava cavalos que atuavam em produções cinematográficas, e o negócio da família, a Haywood Hollywood Horses. Após a morte do pai, supostamente vítima da queda de objetos oriundos de um avião, OJ e Emerald tentam tocar o negócio e o rancho erguidos pelo pai. O casal de irmãos vê no aparecimento de algo estranho no céu, uma oportunidade de filmá-lo e ganhar dinheiro com isso.
Os dois são descendentes de Alistair E. Haywood, que no filme seria o jóquei negro que teria montado o cavalo na série de fotos históricas do fotógrafo Eadweard Muybridge, chamada de “The Horse in Motion”, em 1877. As fotos postas em sequência em projeções são consideradas um avanço importante na direção do surgimento do cinema. O casal de irmãos vê no aparecimento de algo estranho no céu uma oportunidade de filmá-lo e ganhar dinheiro com isso. A questão é que Jordan Peele traz esses elementos reais (como a sequência de fotos que faz parte da ancestralidade do cinema) e se aproveita da falta de um registro seguro sobre a identidade e sobre e cor da pele do jóquei para misturar com ficcionalidades criadas por ele (que também assina o roteiro), como a família Haywood. O diretor toma a liberdade de criar esse núcleo familiar, de dar um nome a esse jóquei e de tomá-lo como negro (algo que não é oficial, mas que pode ser real). Fazendo assim, o fictício jóquei do filme, tataravô de OJ e Emerald, passa a ser, no filme, um símbolo de tantos negros e negras que fizeram parte da história do cinema, dos seus primórdios até agora, e não foram reconhecidos. E coube aos irmãos Haywood a missão de fazer essa reparação histórica montada brilhantemente pelo diretor.
O longa de Peele não se destaca somente pelo aspecto da reflexão social, há também a forma como o diretor vai inserindo a presença misteriosa que se esconde nos céus. É um filme que não tem pressa. Não tem pressa para mostrar a sua ameaça, não tem pressa para deixar os elementos de horror penetrarem na trama, o que vai acontecendo bem aos poucos. Quando chega a hora, porém, o cineasta trabalha muito bem esses aspectos. Como na sequência em que a ameaça alienígena se mostra e ataca a Emerald e o Angel (Bandon Perea) que se encontram dentro da casa no rancho. Casa essa que é banhada por sangue, numa sequência sensacional. Outro aspecto bem trabalhado e inserido na trama é o humor. Esse é um elemento que aparece mais do que nos outros filmes do diretor, e é bem equilibrado e utilizado. O elenco traz, além de Kaluya e Palmer, Keith Deivid (como o pai, Otis Haywood) e tem também Steven Yeun, que vive uma ex-estrela mirim da TV. Os flashbacks que contam o seu passado são dos momentos mais intrigantes e sensacionais do filme.
A Trilha sonora…
A trilha sonora do filme é assinada por Michael Abels, que já trabalhou com Jordan Peele em seus dois filmes anteriores, “Corra” e “Nós”. Abels é um estudioso e especialista em música afro-americana. Além das canções de Abels, entre outros nomes, estão na trilha, a atriz Jodie Foster com “La Vie C’est Chouette”, The Lost Generation “This Is The Lost Generation” e Dionne Warwick com “Walk On By”.
Recomendamos…
“Não! Não Olhe!” é para ser visto e revisto. É um filme que te diverte, te assusta, te faz pensar. É mais um grande acerto do diretor que vem se consolidando como um criador de clássicos do horror. – Nilvio Pessanha.
ASSISTA AO TRAILER: https://www.youtube.com/watch?v=l05c7Z8aD0Q
Nilvio Pessanha é morador do bairro de Campo Grande na zona oeste carioca, agitador cultural, coordenador do cineclube Cine Rua ZO, professor de língua portuguesa e literatura no município e do estado do Rio de Janeiro, pai do Francisco, vascaíno, é membro dos podcasts Trincheiras da Esbórnia (OUÇA AQUI!) e Cine Trincheiras (CONHEÇA AQUI)!